É melhor parcelar ou pagar à vista com desconto os tributos IPTU e IPVA?
Olá pessoal!
Estamos de volta!
Havia prometido um segundo Post sobre Loterias. Contudo, no embalo dos compromissos financeiros de início de ano resolvi publicar este, porém não menos importante. Nele avalio se vale mesmo a pena pagar os impostos de forma antecipada. Não ficarei aqui relembrando o tempo todo que o contribuinte precisa reservar dinheiro suficiente para pagar estas despesas recorrentes no início do ano. Isto será assunto para a série de Post sobre Planejamento Financeiro.
Objetivos:
- Demonstrar, financeiramente, se é vantajoso pagar os impostos IPTU (Salvador) e IPVA (Bahia) antecipadamente com desconto;
- Introduzir o conceito financeiro de Valor Presente Líquido.
Boa leitura.
“Time is Money”
Segundo a Wikipedia, esta expressão foi utilizada pela primeira vez em 1.748 por Benjamin Franklin em “Advice to a Young Tradesman, Written by an Old One”. Desde então, tem sido usada constantemente por aqueles que não tem tempo a perder. Resume, em apenas três palavras, o conceito econômico de Custo de Oportunidade visto no Post anterior. Afinal, “gastar” nosso tempo descansando ou produzindo valor é uma questão de escolha.
Mas, essa frase embute ainda outro conceito, desta vez, um financeiro - o do Valor do Dinheiro no Tempo.
Pare e pense:
- R$ 100,00 vale mais hoje ou daqui a 5 anos? Por quê?
- Você prefere receber os R$ 100,00 agora ou daqui a 5 anos? Por quê?
- Se você pudesse escolher entre receber R$ 100,00 agora ou R$ 120,00 daqui a 5 anos, qual seria sua opção? Por quê?
Espero que tenha pensado nas respostas antes prosseguir. A reflexão é o caminho para treinarmos nossa mente.
Vamos às respostas:
R1) R$ 100,00 vale mais hoje. Isso ocorre em função de um fenômeno muito conhecido de nós, brasileiros: a Inflação. É bem verdade que esta fera encontra-se relativamente domada desde a implantação do Plano Real. Mas o risco ainda nos espreita. Sem me alongar demais nessa discussão, o fato é que a inflação corrói o poder de compra da moeda fazendo com que a mesma quantia de dinheiro não consiga adquirir a mesma quantia de produtos no decorrer do tempo.
R2) Além do fator exposto na resposta à primeira pergunta, agora surge mais um a ser considerado: a Incerteza. Em cinco anos muita coisa pode ocorrer: posso não estar mais vivo, a inflação pode sair do controle, governos podem ser derrubados, etc. Enfim, estamos expostos a uma infinidade de incertezas que, caso aceite receber o dinheiro no futuro, nada pode garantir 100% de segurança de que o fato se consumará. Portanto, “é melhor um pássaro na mão do que dois voando”, não?
R3) Imagino que para essa pergunta algumas pessoas possam ter respondido “Quero receber em 5 anos, claro! R$ 120,00 é vale mais que R$ 100,00! Representa um ganho de 20%”. Outros podem ter pensado “Prefiro receber agora! Posso aproveitar R$ 100,00 e transformá-los em muito mais do que R$ 120,00”. Qual dos dois está certo?
Acertou aquele que respondeu DEPENDE. Contudo, de forma alguma podemos afirmar que os dois anteriores estão errados. Isto decorre do fato de que a pergunta omitiu uma informação fundamental: a Taxa de Juro de Referência.
Juro (É assim mesmo que se escreve, apesar de comumente ouvirmos e utilizarmos "juros"), como todos sabem intuitivamente, pode ser definido como o custo do dinheiro. Mas o juro é igual para todo mundo? Não. A Taxa de Juro de Referência é diferente para cada pessoa. É justamente daí que surge a divergência entre aqueles que desejam receber imediatamente (pois têm expectativa de que conseguem um rendimento maior que a taxa de juro ofertada para o período) e aqueles que aceitam receber num momento futuro (e têm expectativa de que a taxa de juro ofertada para o período supera qualquer outra aplicação do dinheiro).
Quando calculamos o valor equivalente de, por exemplo, R$ 100,00 daqui a 5 anos estamos calculando o valor Valor Futuro. Quando calculamos quanto vale hoje R$ 100,00 que serão recebidos daqui a 5 anos estamos calculando o Valor Presente Líquido (VPL).
De forma resumida (Sim! É possível escrever um tratado inteiro sobre o valor do dinheiro no tempo), são esses os fatores que as pessoas precisam ter em mente quando se depararem em situações em que devam escolher entre realizar um pagamento à vista ou parcelado. Caso queira aprender matemática financeira com maior profundidade é só vasculhar a Web. Há vários sites que, de maneira simples e didática, podem suprir esta necessidade.
Para analisar a situação de forma prática, escolhemos os tributos IPTU (Salvador) e IPVA (Bahia). É preciso analisá-los separadamente porque o Fluxo de Caixa de cada um é diferente e, no caso especial do IPVA, o vencimento depende da numeração da placa e, como o dinheiro tem valor no tempo, isso influenciará no resultado dos cálculos.
Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU)
Segundo informações no site da Secretaria Municipal da Fazenda de Salvador (ainda não sei porque insistem em manter este nome!) o IPTU pode ser pago em 11 parcelas, com vencimento sempre no dia 05 de cada mês, a partir de fevereiro. Também é dado ao contribuinte a oportunidade de pagar em cota única, com vencimento em 05/02, sendo que, neste caso, teria um desconto de 10% sobre o valor devido. Vale a pena aproveitar este desconto e pagar à vista?
Vamos aos números!
Valor do IPTU: R$ 626,74
Pagamento Parcelado: 1ª parcela (05/02): R$ 57,14; Demais parcelas 10 x R$ 56,96.
Desconto para pagamento à vista: 10%
Valor com desconto: R$ 564,07
Taxa de Juro de Referência (SELIC): 7,25% ao ano
Escolhemos a SELIC como taxa de referência porque, em tese, Títulos Públicos é, após a Poupança, o investimento mais seguro. A escolha da taxa de referência é de extrema importância porque ela é determinante para avaliar a viabilidade da operação.
O primeiro passo é calcular a taxa de juro equivalente ao mês. Dividiremos a taxa ao ano por 12 porque os pagamentos são mensais (Esclareço que não é esse o conceito de taxa de juro equivalente. Faremos isso apenas para simplificar). Encontramos, então, uma taxa de juro de 0,60% ao mês. Agora tudo que precisamos fazer é calcular o Valor Presente Líquido do Fluxo de Caixa. Para isso, usaremos o Excel e sua função VPL(). O gráfico abaixo compara o valor nominal do IPTU com VPL (dada a taxa de juro de 0,60% ao mês) e o valor a ser pago com desconto de 10%:
O raciocínio por trás do gráfico é o seguinte:
- O valor do imposto a pagar é R$ 626,74;
- Pagar parcelado, da forma proposta (dada a taxa de juro mensal de 0,60%) equivale a pagar R$ 608,26 à vista;
- A Prefeitura Municipal me permite pagar R$ 564,07, caso pague à vista;
- Logo, como R$ 564,07 é menor que R$ 608,26, é mais vantajoso que eu pague à vista.
Pois bem. Aí está a resposta para a questão. Ao pagar à vista você estará lucrando R$ 44,20 (R$ 608,26 – R$ 564,07).
Mas cuidado! Aqui vai um alerta: Fiquem atentos às “promoções”. O desconto ofertado nem sempre é o desconto real.
Veja que se anuncia um desconto de 10% sobre o valor de R$ 626,74, o que resulta em R$ 62,67. Só que R$ 626,74 é o total desembolsado para pagamento em 11 parcelas. O valor equivalente para pagamento à vista seria R$ 608,26. Portanto, seu desconto REAL é de R$ 44,20 ((R$ 608,26 - R$ 564,07) / R$ 608,26), ou seja 7,3%. Percebeu?
Com isso não estou dizendo que há má fé da maior parte dos comerciários no sentido de fazer propaganda enganosa. Até acredito que muitos nem tenham essa noção de matemática financeira. O que quero é apenas alertá-lo que a matemática financeira tem “armadilhas” para pegar os incautos.
Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA)
Informações detalhadas sobre o IPVA podem ser obtidas no site da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia.
O primeiro ponto a considerar aqui é que veículos com placas diferentes possuem datas de vencimentos diferentes. Portanto, de cara, já levam mais vantagem os proprietários de veículos com placas terminadas em 1. Isso porque a quantidade de dias entre a data do pagamento com desconto e a data do vencimento do tributo é menor para esses proprietários.
Exemplificando: Imagine que você exige, para cada dia de antecipação de um pagamento futuro a taxa de 0,02%. O IPVA da Pessoa 1 (P1) tem um pagamento vencendo daqui a 90 dias, portanto, a taxa mínima de desconto deverá ser de 1,8% (0,02% x 90 dias). Já o da Pessoa 2 (P2) vence daqui a 270 dias, exigindo uma taxa mínima de desconto de 5,4% (0,02% x 270 dias). Em ambos os casos, o IPVA com desconto vence hoje e o desconto ofertado é de 10%. Pois bem, P1 exige 1,8% de desconto e leva 10%. P2 exige 5,4% e leva o mesmo 10%. Perceba que em ambos os casos a troca é vantajosa, contudo, é mais vantajosa para P1.
O segundo ponto a ser considerado é que é possível ter dois descontos diferentes. Caso o pagamento ocorra no dia 28/02, o desconto será de 10%. Caso ocorra até o vencimento da 1ª cota será de 5%.
O terceiro e último ponto é que, caso opte por pagar parcelado, o vencimento das parcelas será antecipado ao vencimento do tributo. Por exemplo, se o seu veículo termina com final 0, o vencimento do tributo será 24/09/2013. Caso queira pagar parcelado, os vencimentos serão em 23/07, 23/08 e 24/09/2013. E é aqui que está a parte mais curiosa desta análise, como verão adiante.
Em função das diferentes datas de vencimento, efetuaremos os cálculos tendo como base veículos cujas placas terminam em 1 (vencimento em 20/05) e que terminam em 0 (vencimento em 24/09).
Vamos aos números!
Valor do IPVA: R$ 360,45
Pagamento Parcelado: 3 x R$ 120,15 (sendo que Final 1 vence em 18/03, 18/04 e 20/05; Final 0 vence em 23/07, 23/08 e 24/09)
Desconto para pagamento à vista: 10%
Valor com desconto: R$ 324,41
Taxa de Juro de Referência (SELIC): 7,25% ao ano
Dessa vez vamos dividir a taxa anual por 365 para encontrar a taxa diária: 0,02%. Por que diária? Pelo fato de que a diferença entre a data do pagamento antecipado e os respectivos vencimentos do tributo não coincidem com um período mensal. Isso, por si só, distorceria os resultados.
Calculando o VPL, novamente com ajuda do Excel, obtemos os seguintes resultados, plotados no gráfico abaixo:
A resposta, mais uma vez é que sim, vale a pena pagar o IPVA antecipado porque os possíveis VPLs dos fluxos de caixa são todos maiores que o valor líquido após o desconto.
Agora vamos a dois pontos importantes que podem ser observados no gráfico. Como sua lógica foi explicitada anteriormente, ao tratarmos do IPTU, apenas ater-me-ei às novidades.
Primeiro ponto: Perceba que os VPLs do veículo com placa terminada em 1 é maior do que os do veículo com placa terminada em 0. Isso significa dizer que o desconto REAL para o veículo 1 é maior que o do veículo 0. Vejamos:
- Veículo 1: (R$ 341,21 - R$ 324,41) / R$ 341,21 = 9,3%
- Veículo 0: (R$ 332,71 - R$ 324,41) / R$ 332,71 = 6,6%
Isso se dá em função do veículo 0 ter mais tempo para descapitalizar os juros, ou seja, como o período que ele dispõe é maior, as suas incertezas são maiores, com isso o Custo de Oportunidade para ele é maior.
Segundo ponto: O VPL do pagamento parcelado do IPVA é MAIOR do que o VPL do pagamento sem desconto. Se você prestou bastante atenção no primeiro gráfico do IPTU, diferentemente desse do IPVA, o VPL do parcelamento é menor que o valor nominal. Mas por que, então, o VPL do parcelamento no IPVA deu maior do que o pagamento sem desconto? Isso quer dizer que é melhor pagar de uma vez, sem desconto, do que parcelar? Por quê?
Aconselho que, agora, dê um tempo na leitura e reflita um pouco antes de prosseguir. Tente achar você mesmo a resposta. Volte aos dados e compare os Fluxos de Caixa parcelados dos dois tributos. Qual é a diferença entre os dois parcelamentos?
A resposta é simples: No parcelamento do IPTU, os vencimentos das parcelas são postecipados ao vencimento do tributo. No parcelamento do IPVA, os vencimentos das parcelas é antecipado ao vencimento do tributo. E, para Matemática Financeira, isso faz toda a diferença.
Pagar o IPVA parcelado significa que o contribuinte está ADIANTANDO valores futuros ao Governo Estadual e sem nenhum desconto para isso. Significa dizer que ao parcelar o pagamento do IPVA o contribuinte está pagando juro ao Governo Estadual.
Soou estranho? Não se preocupe! Deve ter soado estranho para muitos leitores. Não é natural do brasileiro pensar essas questões sobre a ótica da Matemática Financeira. O problema é que, com isso, os consumidores e contribuintes gastam milhões de reais com juro “oculto” e ainda acreditam que estão fazendo um ótimo negócio.
Mas, acreditem em mim, assim como não existe almoço grátis, NÃO EXISTE PARCELAMENTO SEM JURO.
Simples assim.
Um grande abraço e até a próxima!
PS: Estou disponibilizando as planilhas utilizadas para realização dos cálculos, na versão GoogleDocs, para que possa simular seu tributo e fazer as mesmas avaliações deste Post. São muito intuitivas e, acredito que dispensam maiores explicações a respeito do seu preenchimento. Porém, se ainda assim precisarem de ajuda ou desejarem a versão em Excel, coloco-me à disposição!
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